sexta-feira, 2 de abril de 2010

sofia

- Ah, vou ao cinema com o Fred, se quiser vir...

Não. Sofia desligou o décimo quinto telefonema desesperado para sair de casa. Não, ela não queria sair com a amiga e o Fred, não queria segurar vela de novo. Desistiu. Ficar em casa, essa é a questão. Ligou a TV, estava naquele canal de propagandas, onde uma loira gostosa fazia demonstrações de como ter uma barriga sequinha em três dias. Três dias... Sofia tentava ter uma barriga sequinha desde... desde que ela se lembrava.
A vida inteira servindo a todos, sendo tão amiga, compreensiva e sorridente. E aí bastou Sofia surtar (por um feriadão, vale salientar) que todos pareceram sumir. Estava tudo errado, ela não queria ficar ali sozinha, se tivesse alguém que merecia sumir, esse alguém era ela. Por mérito, merecimento. Nem isso. Estava condenada ao programa do abdomen perfeito, ao último gole de vodka que sobrava numa velha garrafa. Mais que isso, Sofia estava condenada a mais uma dor de amor. De novo? Sim, de novo. Mas esse filme ela já sabia de trás para frente. Ia doer agora, ia doer semana que vem. Depois ia começar a melhorar e salve as vezes que encontrasse o desgraçado sorridente, acompanhado de uma vigarista, quase não haveria recaída. Mas o agora é que importava. Importava a dor demasiada de Sofia. Importava o barulho na rua, mostrando que todos tinham uma vida mais importante e feliz que a dela. Importava a tábua de frios em cima da mesa, esperando um jantar a dois. O que mais importava? Nada. Aquela dor familiar já estava camuflado no cansaço da repetição de se decepcionar. E, queridos, quando Sofia se acostumava com uma coisa, ela geralmente desprezava. Então desprezou a dor. Acordou no meio da madrugada no sofá, com a tv fora do ar e uma luz amarelada na casa. Mas antes mesmo de abrir os olhos, Sofia lembrou que estava triste. E por estar triste, merecia mais um pouco de sofá. A tv chiava, o coração doía. E Sofia fazia um esforço tremendo para , novamente, deixar de amar.

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