quinta-feira, 5 de novembro de 2009

(cont) Cap. I - um estranho no ninho de Alice

O sol já estava indo embora quando a família chegou à velha casa da infância de Alice. Ela olhou para o infinito "Rodrigo, essa é a imagem mais bonita que eu poderia te dar". Ele ria do romantismo dela, a olhou bem e viu que o sol refletia nos cabelos castanhos, a deixando quase loira. Pensou "essa cena é mais bonita, Alice" mas não externou. Entrou na casa com o pé direito, mas não deixou ninguém perceber.
Alice fez questão de levá-lo até o quarto onde passaria aqueles dias. O quarto era simples, nada de muito luxo, ou extravagâncias. Não era típico daquela família gastar com o que não fazia falta, apesar da gorda condição financeira. Alice sentou na cama "não é tão fofa como a sua, mas vai te quebrar um galho" e sorriu, como quem cortejava. "Eu estou cansado. Acho que posso tirar um cochilo, não posso? Afinal, o que mais tem pra fazer nessa cidade? Do aeroporto até aqui conheci a cidade inteira", Alice tentou sutilmente 'defender' sua cidade, mas no fundo não havia mesmo muita coisa a ser feita. Deixou Rodrigo no quarto e foi conversar com a família na sala, enquanto todos a perguntavam como caminhavam as coisas e, é claro, sobre o seu 'namoro' com Rodrigo, que ela ainda não tinha conseguido provar que não existia.

2:40 da manhã, Alice tomava café com leite e canela, as pernas estavam totalmente dobradas em cima da cadeira - uma forma de se defender das rãs, sapos e outros bichinhos inimigos que poderiam aparecer. Ouviu a porta de vidro abrir, reconheceu que era Rodrigo pelos passos e pelo cheiro. "Pensei que você só acordava amanhã" - disse antes que ele chegasse até ela- "Dormiria mesmo, mas essa cama é péssima". Alice fingiu que não ouviu. Ofereceu a metade restante de sua xícara e ele aceitou, mas fizeram isso sem dizer nada, apenas olhando um para o outro e para xícara, é claro. "As vezes penso que queria morrer aqui" "Ok, Alice, o campo te deixa suicida?" "Não, seu otário. Falo de envelhecer aqui, descansar quando ficar velha" "Descansar de quê?" "Não sei, Rodrigo. Você não compreende mesmo, não importa", disse quase com voz de choro. "Alice?" puxando o queixo dela com os dedos, afim de ver seu rosto, "Você ficou chateada com essa bobagem?" por um momento ela quase sentiu sensibilidade sair das palavras dele, mas lembrou-se de quem se tratava e engoliu o que pensou dizer. "Não, Rodrigo, não é você. Acho que estou exausta da viagem, devo estar estressada por isso e emotiva pela volta". Longo silêncio. "Alice, lembra quando nós fomos aquele bar que tinha uma entrada vermelha? Aquele com um nome em francês, como era mesmo?" "Aquele que a moça vomitou no meu pé no banheiro?" "Sim, sim. Era isso mesmo que eu ia falar. Hoje quando te vi com sua família senti a mesma admiração que senti por você naquela noite" "Você sentiu admiração? Você sente as coisas? - em tom irônico- Não, vai, é sério, por que você ficou admirado?" "Bom, naquele dia você poderia ter feito um escândalo com a moça que vomitou, mas você simplesmente chegou contando a história, você quase sorria da situação...E hoje, bem, você pega tudo o que eu abomino e sei que você nem gosta tanto na verdade, e faz de tudo isso um motivo para estar bem". Alice olhou para baixo, poucas pessoas a envergonhavam quando o assunto era elogios, mas Rodrigo quase nunca os fazia, portanto a deixava sem graça. "Bom, acho que vou pegar algo de gente grande pra beber. Ouvir você falar de mim merece um brinde". Enquanto Alice entrou para pegar a bebida, Rodrigo pegou o celular do bolso, apenas para checar. Uma nova mensagem de texto! Era de Laura, mulher por quem Rodrigo foi apaixonado a vida inteira. Poderia não ser o amor, mas era a mulher de sua vida. A mensagem dizia : 'Sonhei com você. Saudades de acordar num domingo ao seu lado, com você trazendo nuggets de café da manhã! Um beijo.' Rodrigo não conseguiu mais se concentrar em nada, só lembrava do cheiro de Laura e da saudade que, como em um clique, também começou a apontar em seu coração. O que estava ele fazendo naquela porcaria de fazenda? E com Alice?! Alice o irritava, o olhava de um jeito que ele não gostava as vezes. Entrou rápido na casa, antes que ela voltasse. "Alice? Alice! Vou dormir, ok? Ainda tenho sono" "Mas, Rodrigo, eu só estava procurando o saca-rolha" "Amanhã beberemos!" e entrou rápido no quarto, deixando Alice do lado de fora e trazendo Laura para dentro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário